Narrativa tradicional sugere que adoção da tecnologia traz, consigo, a otimização de processos, redução de custos e o impacto em empregos. Mas há cases que mostram o contrário
Os tão replicados futuros distópicos e as promessas de fim das tarefas repetitivas criam um cenário de confusão na cabeça dos profissionais que estão no mercado de trabalho ou em busca de emprego.
É possível citar ao menos uma dezena de filmes ou séries que descrevem futuros extremamente complexos, dominados por máquinas inteligentes, que em sua maioria chegaram à conclusão de que o ser humano não seria capaz (!) de tomar as melhores decisões para garantir uma vida de paz entre povos e harmonia com o planeta. Há claro uma variação ou outra por título, mas em sua maioria os enredos trazem o conflito homem x máquina em que o primeiro tenta retomar o poder, já há algum tempo perdido para o segundo.
Adicione a isso um pouco da narrativa tradicional de que a adoção de tecnologia traz, consigo, a otimização de processos, a redução de custos e o alto impacto em produtividade, sempre acompanhados da ameaça a muitos postos de trabalho. Isso feito, temos um cenário de grande ansiedade e confusão com relação aos reais potenciais de adoção de soluções recheadas de inteligência artificial no dia a dia das empresas.
Essa discussão parece estar aquecendo um pouco mais agora. Em maio de 24, aconteceu em São Paulo um evento da Swile Brasil promovendo um debate sobre o impacto da inteligência artificial na transformação dos negócios. No primeiro painel, mediado por Bruno Montejorge (Swile Brasil), Andreza Maia (Futuros Possíveis) e Gian Martinez (Winnin) falaram sobre oportunidades e desafios trazidos nessa janela mais recente de grandes anúncios sobre IA generativa.
Gian trouxe a reflexão do quanto a criatividade será cada vez mais desafiada a trazer originalidade e o quanto isso pode ser um impulsionador de grandes feitos. Andreza destacou a importância do contexto e intencionalidade no treinamento dos modelos. Ela trouxe a reflexão fundamental do quanto a falta de diversidade na construção das bases, no treinamento das máquinas e na retroalimentação do processo podem ser agentes de replicação de realidades não inclusivas.
No segundo painel, também sob liderança do Bruno, tive o privilégio de participar com o Leo Branco (Exame) de uma conversa sobre os impactos da IA no RH e na transformação na comunicação. Leo trouxe bons casos de uso de como a tecnologia pode ajudar em tarefas repetitivas nas redações, ou naquelas tarefas mecânicas de transcrição de vídeo, por exemplo, e do quanto isso pode acelerar a produtividade e abrir espaço para que os profissionais se dediquem à análise e apuração. Em outro momento, Bruno trouxe o tema do impacto que a exigência de adoção de tecnologia pode trazer nos profissionais, no equilíbrio entre engajamento e saúde mental.
Citei uma conversa que tive com Juliana Sawaia, pesquisadora e consultora de felicidade corporativa, em que ela enfatizou a necessidade de um ambiente saudável e seguro para que os profissionais possam aprender a explorar novos processos e abordagens. Ela lembrou que um ambiente punitivo e que traz insegurança psicológica automaticamente cria uma barreira no aprendizado dos profissionais, já que o estresse afeta quimicamente a pré-disposição cognitiva em aprender, explorar e replicar coisas novas.
Dos muitos eventos nos quais estive presente nesses dois últimos anos, foi a primeira vez que presenciei discussões sobre expectativa e ponto de vista dos colaboradores de forma prática e menos idealizada.
Por exemplo: nas duas edições do Web Summit Rio até agora, 2023 e 2024, os painéis que escolhi assistir e que prometiam respostas sobre inteligência artificial traziam mais dúvidas e hipóteses do que cases.
Principalmente no de 2023, quando grande parte dos avanços dos modelos de LLM (large language model) estavam sendo mais divulgados, as discussões pareciam se concentrar em prazo de validade dos dados, capacidade das máquinas para processamento de informações e tradução em linguagem humana, disputa por direitos autorais etc. As discussões estavam mais distantes do dia a dia do mercado de trabalho.
O caminho proposto aqui nos parágrafos 3 e 4, que busca ampliar a discussão da aplicação caso a caso, no ambiente de cada empresa, sem deixar de lado o diálogo claro com os colaboradores, pode ser um bom motor de aceleração da adoção dessas novas tecnologias com promessa disruptiva. As empresas poderiam ensinar ou orientar os colaboradores a entenderem mais sobre inteligência artificial utilizando a própria inteligência artificial, numa espécie de metalinguagem, fazendo perguntas diretamente ao Gemini ou ao Chat GPT.
Conhecimento prévio é um dos grandes aliados para enfrentar os medos e engajar nos projetos. Talvez algumas pessoas só precisem disso para irem substituindo as más impressões adquiridas nos cinemas e serviços de streaming por cronogramas e planos de ação.